Quando, ainda, não é tarde demais...

No semanário "Expresso" de sábado passado foi publicado este artigo que merece ser lido e pensado com atenção... (1)Trata-de de um artigo que espelha bem não só a ausência de política de infância em Portugal (quem sabe, talvez valha a pena conhecer esta lei) quanto mostra a inércia do actual sistema de protecção de crianças e jovens. (2) Há muito que alguns, "quixotescamente", alertam para as fragilidades do sistema de protecção e para os efeitos perniciosos dessas fragilidades. (3) Há muito (parece) haver vontade política de reformar o actual sistema de protecção de crianças e jovens. (4) Pergunta: não será que conhecendo e estudando, por exemplo, este modelo de acompanhamento de uma reforma, já efectuada no ano de 2007, tudo seria mais fácil e mais ágil? (5) Torna-se um exercício interessante articular os corpos de letra e os sublinhados (a vermelho) numa pequena parte do referido artigo... (6) No próximo mês de Novembro faz 25 anos a Convenção dos Direitos da Criança; é o tempo para que algo de novo (e há muito adiado) aconteça em Portugal: a definição de política integrada de infância (um pacto político para a infância) e a instituição de uma entidade independente para a promoção e defesa dos direitos da Criança (um Provedor da Criança). (7) E que dizer desta notícia?! Ponto.
(...)
"Felizmente, casos tão graves como este são raros”, diz Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Proteção das Crianças e Jovens em Risco (CNPCJR). À frente, desde 2005, do órgão de cúpula que coordena a rede de 308 comissões de proteção de menores espalhadas pelo país, o antigo juiz do Supremo Tribunal de Justiça admite que “é preciso investir mais na prevenção”, sobretudo junto das populações desfavorecidas, mas adianta que “está cada vez mais interiorizada na sociedade a inadmissibilidade dos maus tratos”. Para o procurador-geral-adjunto Francisco Maia Neto, nomeado pelo Governo em fevereiro deste ano para coordenar a revisão do sistema de proteção de menores e com uma longa experiência na área, o cenário é mais delicado do que isso: “O primeiro e maior problema é a fragilidade da própria Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens em Risco”. O magistrado explica porquê: “É uma estrutura muito frágil para as necessidades que existem. Precisa de mais poder, mais autonomia, mais organização”. E dá como exemplo o facto de haver uma equipa de apenas 15 técnicos centralizada em Lisboa, que tem de se desdobrar para dar resposta às solicitações de norte a sul do país. “Como é que conseguem acompanhar casos no Algarve ou no Norte? Com tanta deslocação, como é que têm tempo para trabalhar?” “Algumas comissões de proteção estão de porta fechada” Maia Neto fala ainda da dependência política e partidária das comissões de proteção e do facto de serem tuteladas pelo Instituto de Segurança Social. “É preciso ter algum afastamento e alguma coragem para não dizer sempre sim, sim, sim, está tudo bem. E só se é verdadeiramente autónomo quando se tem pessoal próprio e orçamento próprio.” Têm aumentado os casos graves de maus tratos contra crianças. Mesmo assim é raro que acabem em morte. A lista de problemas identificados pela comissão nomeada pelo Governo para reformar as leis de proteção de menores, e liderada pelo procurador-geral-adjunto, é extensa e inclui a inoperacionalidade de muitas comissões locais. “Algumas estão de porta fechada, com 15 processos por ano. Ninguém lá vai. Muitos dos comissários que são nomeados como representantes de entidades aparecem uma vez por mês”, diz. “E depois gastamos seis milhões de euros por ano em rendas, quando podíamos transferir as sedes para instalações que já são do Estado e que não têm de ser pagas. Esse dinheiro pode ser canalizado para contratar técnicos.” Em todo o país, chegaram a estar afetos às comissões de proteção 150 técnicos, entre assistentes sociais e psicólogos, mas nos últimos anos esses profissionais acabaram por voltar aos seus serviços de origem. Maia Neto espera que estas e outras questões estejam refletidas na proposta final que a comissão por ele liderada deverá entregar ao Governo em outubro, de forma a melhorar o sistema. NÚMEROS 1732 situações de perigo relacionadas com maus tratos comunicadas às comissões de proteção de menores em 2013, 8 mortes de crianças com menos de 12 anos, ocorridas entre 2012 e 2014, em resultado de negligência ou maus tratos, de acordo com o Instituto Nacional de Medicina Legal Segundo as estatísticas da CNPCJ, as denúncias têm vindo a aumentar de ano para ano, sobretudo relacionadas com a “exposição a modelos de comportamento desviante” e a situações de negligência, mas isso não se tem refletido em mais processos abertos pelo Ministério Público. Os dados fornecidos pelo Ministério da Justiça sobre inquéritos-crime e condenações por violência doméstica e maus tratos revelam uma tendência de descida. Em 2012 houve 197 processos instaurados pelo Ministério Público de maus tratos a menores e pessoas indefesas (os dados encontram-se agregados), com 94 condenações, contra 468 processos em 2010 e 247 condenações. Além disso, e de acordo com o inspetor-chefe Paulo Gomes, da PJ, “são muito poucos os casos de crianças que morrem em consequência de maus tratos”. Talvez a exceção seja o Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, onde o volume crescente de casos de violência doméstica e maus tratos a menores, ao ritmo de 180 por mês, fez com que a secção de cinco procuradoras que já trabalhava com o tema tenha passado, em abril, a dedicar-se em exclusivo a este tipo de crimes. “Nota-se um aumento de situações graves em termos de ofensas corporais, mais graves do que no ano passado”, diz uma fonte do departamento. “Normalmente, as vítimas são crianças pequenas, entre os seis e os 12 anos.”


Mensagem recebida (25/08/2014)
Oh, oh, oh, meu caro, então não é que li e reli e reli o seu texto “Quando ainda não é tarde demais”?! E, sim, adicione mais um tema à nossa agenda de conversas urgentes...; a propósito, falta-lhe no texto um substantivo/adjectivo, fundamental para caracterizar o perfil de alguns responsáveis pelo sistema de protecção a crianças e jovens: falta-lhes COMPETÊNCIA...; poderá adicionar ainda falta-lhes Conhecimento, Responsabilidade, Moral e Ética, Sentido e Sentimento de Serviço... E não me vou ficar por aqui. Posso falar-lhe (tintim por tintim) sobre um problema/experiência pessoal (dava um interessante “case study” sobre a forma como actuam essas "entidades pardas") com o qual me debati no decurso do ano passado: até à estupefacção, e este é o "adjectivo" menos pessoal que posso identificar...  E não, pois claro que não, o problema não é só entre os 6 e os 12 anos... Ninguém começa a negligenciar ou maltratar os filhos em "determinado" intervalo etário; os métodos utilizados é que só permitem o reconhecimento "legal" dentro desta faixa etária (com tempo explicar-lhe-ei melhor o que sei e sinto e defendo), porque para intervir antes é preciso muita coragem politica e institucional: e (vida a minha, que raiva!) depois, os " miúdos" deixam de acreditar na salvação e calam-se como condição de auto sobrevivência à distância de uns "poucos" anos (estou tão zangada que até tenho a ideia de acotovelar o meu organizado pensamento)… E não tenha ilusões quanto à omnipotência de um Provedor da Criança: todo o processo  está inquinado (agora até já andam a criar mais comissões de protecção à pressa)... Era preciso, isso sim era, uma reforma de tal forma corajosa que abolisse os vícios do sistema: caso contrário, alguns Provedores da Criança (se alguma vez existirem..) irão para a pira antes de se conseguirem resultados… Tem direito ao contraditório, meu caro, claro que tem! E terá a minha mais empenhada e sentida atenção, óbvio que sim!”

Comentários

  1. ….o superior interesse da criança!
    Explicar um conceito tão indeterminado e vago, eu próprio me interrogo, onde começa e onde termina? Não sou técnico, apenas um comum cidadão que aparentemente começou a estar mais atento e a ler mais sobre estes assuntos, porém de uma forma muito ligeira e ainda prematura, mas sobretudo a tentar entende-la perante o seu real contexto.
    A sociedade de hoje apenas devora e comenta o imediato da notícia, depois esquece-o. Por outra via, o lado moderno, comercial e lucrativo da notícia é sempre aquele que é negativo. Talvez por isso as sociedades de hoje estejam deprimidas, de braços para baixo e mergulhadas num egoísmo impar…
    Mas como pode a sociedade de hoje ter acesso a fazer algo de positivo por crianças e jovens em risco? Os adultos e a sociedade tende a cortar-lhes a voz e vivem num circuito fechado nos centros específicos, onde muitas vezes aqueles que se dizem mais empenhados na sua defesa, limitam-se a gerir a informação de processos com centenas de folhas acumuladas…e depois vem o débil investimento por parte do estado, ou sobretudo na gestão dos recursos que lhe estão conferidos e à disposição destas organizações e técnicos que lidam diariamente com esta realidade. A par de tantos estudos, julgo que é tempo de actuar.
    A Convenção dos Direitos da Criança, confere o seu direito à expressão da sua opinião, pois bem, digam-me onde e quando é que ela é ouvida?

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