A minha fada é uma princesa, tenho a certeza!


Vou contar-lhe mais uma história, meu caro, disse-me a fada mais desejada, enquanto eu tentava adormecer. Fiz que não ouvi mas ela continuou: a história do dia, meu caro. Já a noite me envolvia como uma fotografia descolada da moldura e eu, nada, nem resposta. Moita, carrasco! Muito bem, gracejou, sei perfeitamente que está curioso e vou continuar a falar. De há uns anos para cá, começaram a chamar-me princesa. Amigos, colegas de fadices, até estranhos que soltam piropos na rua. Não é o máximo?! Não me lembro de ter sido princesa em Atenas e fico surpreendida porque me estão sempre a dizer que pareço uma princesa egípcia ou mourisca. Verdade. Juro, palavra de fada! (Será por causa do olhar? Do cabelo negro? A sugestão de realeza acentuou-se por causa da minha franja?). Intrigado com a conversa, decidi responder (ainda que descuidadamente), dizendo que gostava que lhe chamassem princesa. E este meu gostar, continuei a dizer, nada tem a ver com o facto de ser uma princesa ateniense, egípcia ou mourisca; tem a ver com o seu rosto. Com o meu rosto?- Interrompeu-me com os olhos aconchegados nas mãos meninas. Com o seu rosto, sim, insisti. Com o seu rosto porque quando me olha com esse seu olhar tão fixo, tão antigo, séculos passados vacilam em cotejos profundos. Meu caro e adorado poeta de trazer por casa, invectivou-me, acaba de falar de uma forma que não diz nada, mais parece um disco riscado; até me apetece respondendo-lhe, do mesmo jeito, que o seu discurso mais se assemelha a um rouxinol debicando suaves madressilvas. Não gosto nada, mesmo nada, respondi, quando decide brincar comigo dessa forma. Eu apenas estava a tentar dizer que a sua beleza me submerge, que submerge o mais fundo de mim; e quando assim é, dissolvo-me e sinto-a em mim, sinto até a minha voz ficar mais fina como se cada parcela de si em mim estivesse soldada pelo fogo que queima sem se ver… Calei-me, quando percebi que ela dizia baixinho: venha comigo, venha comigo para a minha ilha de potes de cerâmica mourisca guardando água dourada, de limões suspensos com lampiões, de cantos flauta mouros e do som macio de alpergatas…E concluiu, dizendo que ela era a fada das coisas frágeis e que, há séculos, preserva para mim,  num cofre de que só ela conhece o segredo de acesso, o que há de melhor no mundo...
A minha fada é uma princesa, tenho a certeza!

Comentários

Enviar um comentário

Mensagens populares