ADSE - Pensar bem antes de falar


Abriu da pior forma "a caça" à reforma do Estado: primeiro, pela divulgação atabalhoada de um relatório técnico elaborado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) sobre as necessárias reformas estruturais do Estado português, reclamadas por um conjunto de economistas que regularmente visitam Portugal; depois, pelas contraditórias declarações de porta-vozes do partido socialista português (que, a curto prazo e legitimamente, deseja ser governo) sobre a extinção ou não extinção do subsistema de saúde ADSE (Assistência na doença aos Servidores Civis do Estado).
O mínimo que se pode dizer quanto ao referido relatório, é que a sua divulgação política (será que o governo tinha mesmo intenção de o divulgar?) apenas em língua inglesa, é de muito mau gosto, se a responsabilidade da sua divulgação for (directa ou indirectamente) do governo. Felizmente que, em boa hora e em tempo útil, um conjunto de voluntários se apressou a traduzi-lo para a língua portuguesa. Neste relatório, no capítulo VII. Saúde, p. 75 e seguintes, tecem-se considerações interessantes e fundamentadas sobre a despesa pública com a saúde pública em Portugal e, consequentemente, apresentam-se propostas para minorar essa despesa pública com os cuidados de saúde; e, no número 80, p. 76 deste capítulo VII, afirma-se que “o sistema de cuidados de saúde permanece fragmentado com três sistemas principais coexistentes e sobrepostos.
Neste contexto, as declarações desencontradas de porta-vozes do partido socialista que (pasme-se!), apenas numa manhã, conseguiram dizer de uma assentada uma coisa e o seu contrário, revelam algum desnorte, patenteiam um aparente e um  muito estranho (des)conhecimento das características específicas do subsistema de saúde ADSE, demonstram e mostram à saciedade a ausência (se não é verdade, pelo menos parece!) de uma proposta já organizada e consensualizada (dentro do partido socialista) de uma reforma consistente dos sistemas de saúde em Portugal.
Atente-se que até nem seria difícil (parece) ter "em carteira" uma proposta de reforma pensada, clara e segura (quer o governo quer os partidos da oposição) dos actuais sistemas de saúde em Portugal. Diz-se no relatório, na página 76: "...o SNS é complementado por planos de seguro especiais públicos e privados para determinadas profissões (por exemplo "subsistemas de saúde" para os funcionários públicos, as forças armadas e a polícia) que constituem 20-25 por cento da população, e por seguros de saúde privados voluntários.". Esta afirmação encaminha o pensamento para o lugar central, na reforma estrutural dos sistemas de saúde, do actual Serviço Nacional de Saúde que (pode continuar a ler-se no relatório), "...constitui a parte maior do sistema de cuidados de saúde e é um sistema universal e grandemente financiado por impostos.
Nesta linha, uma leitura fina e muito aturada dos dados disponíveis relacionados com o financiamento, o funcionamento e sustentabilidade de apenas dois sistemas de saúde (consultem-se, a propósito, aqui e aqui os Decretos-Lei que instituíram o subsistema de saúde ADSE e o sistema SNS), confirmará sem dúvida, a hipótese simples de que deveria ser o SNS a aproximar-se do subsistema de saúde ADSE (quem beneficia deste subsistema de saúde, pagou e paga do seu bolso) e não o contrário. Assim, a extinção, pura e simples, do subsistema de saúde ADSE parece não fazer sentido, a menos que a sua extinção obedeça apenas a critérios ideológicos em favor do Sistema Nacional de Saúde (em rigor deveria denominar-se de Sistema Nacional Público de Saúde); critérios que assentam na ideia de que o subsistema de saúde ADSE, essencialmente desde o ano de 2010, é uma forma encapotada, ardilosamente pensada e gizada, de financiamento público do sector privado de saúde. Podendo admitir-se, no entanto, a insustentabilidade futura (dada a actual e em curso reforma do Estado) do subsistema de saúde ADSE, importante seria (desde que comprovada essa insustentabilidade) que este subsistema de saúde se reestruturasse e se reformasse. Revestindo, por exemplo, a forma de um seguro público (ou mutualista, admita-se enquanto hipótese) de saúde; um seguro de saúde público a que todos os cidadãos, por opção individual, pudessem ter acesso em condições a estabelecer; e sem prejuízo (é óbvio!) dos direitos já adquiridos pelos actuais beneficiários que para esse subsistema de saúde já descontaram e descontam (são mais de um milhão e 300 mil (titulares no activo e aposentados e familiares).
Se assim vier a ser (desde que imperativamente tenha que acontecer a reforma do subsistema de saúde ADSE), o Estado não só prestaria melhores serviços de saúde a todos os cidadãos quanto optimizaria  as redes de serviços de saúde (públicos, privados, cooperativos e de iniciativa social), bem como dedicaria ainda mais atenção a cuidados de saúde mais especializados e mais qualificados para os cidadãos mais frágeis e mais carenciados; e, dar-se-ia assim um passo importante para que os custos (que parecem continuar a ser um poço sem fundo) com o funcionamento do actual Sistema Nacional de Saúde, passassem a ser bem geridos, fossem financeiramente sustentáveis e garantissem a qualidade e a rentabilidade máxima dos serviços.
Pensar bem antes de falar, é económico e faz bem à saúde, creio!

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