Via Graça (6)

Interrogava-me eu ainda sobre o sentido de “a vontade de querer indomitantemente” depois ter feito um meticuloso percurso pela ciência, pela filosofia e pelas neurociências a propósito da intuição feminina...Eis que aparece uma fada alada garantindo, com saber de experiência feito, que há coisas na vida que por muito que as queiramos, não as teremos ou não acontecerão porque não dependem da nossa vontade. Ainda não tinha percebido o que isto poderia querer dizer, quando em surdina, no soprar do vento, essa fada continuou dizendo que “outras (coisas na vida) há que se querem evitar, mas mesmo que se escolha outro rumo, estão lá, no fim do caminho e não vale a pena fugir...”
Vejo-me agora numa situação estranha e com duas alternativas no horizonte. Ou aceito, sem pestanejar, o que ela afirma com tanta segurança ou tento contrariar, com provas credíveis, aquelas asserções. Sei que tenho sempre dificuldade em abandonar o meu objectivo (neste caso contrariar as asserções); mas tendo aprendido que se deixarmos actuar a nossa capacidade de abandonar uma certa maneira de estar, novos horizontes assumem novas formas e novos sentidos (é da espera e do sofrimento original que surge o pensamento e a criatividade), inventei uma terceira alternativa: continuar a escutar, numa suave brisa de vento, essa fada madrinha.
Vai precisar de muita imaginação e criatividade se tentar contrariar o que acabo de dizer; e tenha cuidado com os argumentos que utiliza, sim? – Disse ela, com um toque de afabilidade, quando eu já tinha decidido começar a entrar em minúcias. Falou como se tratasse de algo absolutamente certo e impositivo, garantido pela rica simplicidade desse seu resmungar um pouco divertido.
Murmuro, porque estava a pensar baixinho, um assentimento meio agradecido, antes de lhe dizer: a meu ver, devemos sempre explicar tudo o que sabemos e aquilo em que acreditamos.
Estava aqui a pensar que devia deixar de se preocupar com a vontade de querer e que devia, isso sim, falar sobre um seu avô, cabendo-lhe a ele decidir o que e como deve escrever, respondeu ela; ao mesmo tempo que garantia que eu tinha comigo um poema que esse meu avô fez no início de um mês de Fevereiro (porquê a precisão, início do mês de Fevereiro?) quando eu tinha três para quatro anos.
É verdade que tenho uma série de muito boas recordações de um meu avô (até já escrevi sobre a sua personalidade) mas não me lembro da existência desse poema – disse eu, num tom muito inseguro.
Nesse caso, disse ruborizada com os olhos a luzir e as mãos a falar, sugiro vivamente que acredite naquilo que eu lhe digo, esforce-se e, quando tiver tempo, escreva sobre o amor incondicional; aliás, as suas linhas escritas, sem mim, não teriam significado...Ou será que ainda não deu por isso?

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